Por dia nascem em média 19 bebés prematuros em Portugal

Quando forem maiores, as gémeas Madalena e Francisca provavelmente terão dificuldade em acreditar que a primeira roupa que vestiram tinha o tamanho de uma mão, que a tetina da primeira chupeta era mais pequenado que uma amêndoa e que os pés couberam em sandálias porta-chaves. Por dia nascem, em média, 19 bebés prematuros em Portugal.

Assinala-se hoje o Dia Mundial da Prematuridade. Os dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), divulgados esta semana, revelam que no ano passado nasceram 6922 prematuros (abaixo das 37 semanas de gestação), o que dá uma média de 19 por dia. Representam 8% do total de bebés que nasceram com vida em 2018. Em 2013 essa percentagem era de 7,8%. Nos últimos seis anos (2013-2018), mostram os números do INE, nasceram 40.402 prematuros.

Ser prematuro, diz o dicionário, é o que “amadurece antes do tempo”, “precoce”, “que se faz ou ocorre antes do tempo normal”. Madalena e Francisca nasceram no Hospital de Santa Maria, em Lisboa, a 16 de Junho, às 23 semanas e quatro dias de gestação. Desafiaram o limiar da viabilidade – idade gestacional ou peso de nascimento a partir da qual sobrevivem mais de 50% dos recém-nascidos – que está nas 25/26 semanas.

A história desta “caminhada muito saborosa, embora dolorosa muitas vezes”, como diz Patrícia Almeida, a mãe gestante das gémeas, começou a ser escrita antes. Foi quando às 17 semanas de gravidez teve de ficar em repouso absoluto, porque o colo do útero dava sinais de ceder. Na véspera das 21 semanas de gestação foi internada no 4.º piso do hospital, no serviço de ginecologia, porque “o colo do útero estava aberto e a bolsa do primeiro feto a sair”.

“Foi uma das piores noites das nossas vidas. Estava internada e ainda faltava metade da gestação”, conta Patrícia, de 34 anos. Ela e Alexandra Carvalho, um ano mais velha, casaram-se em Maio do ano passado e ter uma família fazia parte do projecto. Patrícia engravidou em Janeiro, após uma fertilização artificial.

Muitas vezes não se sabe a causa da prematuridade. Mas existem factores que elevam o risco. Um deles é a idade da mãe. No ano passado, 10,6% dos bebés prematuros eram de mães com mais de 40 anos. Outro factor de risco é a gravidez na adolescência. Em 2018, os bebés de mães com 19 ou menos anos representaram 8% do total de prematuros.

“Existe outro factor importante – as mulheres com doenças graves a quem antes era desaconselhado engravidar e que hoje, depois de informadas dos riscos, decidem fazê-lo. Mulheres que foram objecto de um transplante, em diálise, com doença renal ou cardíaca”, refere Diogo Ayres de Campos, director do serviço de ginecologia do Hospital de Santa Maria. O parto pré-termo também “pode ser espontâneo”. “Sem razão, dá-se o início do trabalho de parto. Representa um terço das situações.”

Os obstetras e os neonatologistas dão às mães e pais dão toda a informação sobre o que pode acontecer. “Se não damos a magnitude do risco, as mulheres não são verdadeiramente informadas da probabilidade de sobrevivência e dos riscos de sequelas”, explica Ayres de Campos.

“Sentimos que nos deram tudo”, diz Patrícia. Alexandra pega na frase e termina-a: “Quiseram investir em algo que à partida não teria viabilidade. Funcionou no nosso caso.” Depois de muitos dias internada, Patrícia acabou no bloco de partos às 23 semanas e dois dias e, quando tudo parecia que ia acontecer, as contracções pararam. Já não saiu dali, sempre com uma incubadora ao lado, à espera. As gémeas nasceram dois dias depois, às 23 semanas e quatro dias. “Essa pode ter sido a chave do sucesso”, diz Patrícia. Cada dia a mais passado na barriga da mãe faz disparar a probabilidade de sobrevivência destes bebés. “Disseram-nos que elas não iam chorar, mas choraram quando nasceram”, conta Alexandra, que assumiu que foi “um choque” quando viu as suas bebés tão pequeninas “rodeadas de fios e tubos”.

Quando estes bebés sobem à neonatologia, no 7.º piso, as enfermeiras dão-lhes o último nome da mãe. Mas aqui, em vez de Almeida, as enfermeiras escolheram um outro nome de Patrícia. “Ficaram as Guerreirinhas 1 e 2. Elas nem têm Guerreiro no nome”, conta Patrícia.

Madalena e Francisca são prematuras extremas, classificação dada aos bebés que nascem abaixo das 28 semanas de gestação. Representam cerca de 1% do total de bebés nascidos com vida. Madalena foi a primeira. Pesava 630 gramas e media 31 centímetros. Francisca nasceu duas horas depois, com 640 gramas e 30,5 centímetros. Estiveram internadas 105 e 116 dias, respectivamente. As mães conhecem bem o corredor da neonatologia, com fotos de bebés que nasceram antes do tempo. Madalena teve uma infecção respiratória, Francisca uma perfuração no intestino.

Segundo o registo do Recém-Nascido de Muito Baixo Peso ao Nascer/Grande Prematuridade, entre 2013 e 2018 nasceram em Portugal 70 bebés às 23 semanas de gestação e menos de 1500 gramas. Madalena foi a primeira a ir para casa. Tinha o correspondente a 38 semanas de gestação. Francisca foi duas semanas depois. Ambas sem sequelas aparentes e sem precisar de apoio de oxigénio. Estão agora com cinco meses. Quando forem mais velhas, ficarão a saber que foram as “Guerreirinhas 1 e 2” do Hospital de Santa Maria e que mais meninos e meninas como elas batalham todos os dias para sobreviver.

Fonte: Público

Artigos relacionados